Discussão/ Reflexão: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Re: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

por João Paulo Pereira -
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Cara Júlia
Faz uma análise atenta e cuidada da intervenção pedagógica da professora Raquel Pereira. Ao nível do instrumento de diagnóstico, sugere ir mais além no sentido de perceber as necessidades comunicativas dos formandos (embora se procure perceber quais os interesses pessoais). Concordo que quanto maior for o conhecimento que tivermos dos formandos, melhor a resposta que lhes podemos dar, em termos de propostas de trabalho. Podemos assim mais facilmente propor tarefas diversificadas que sejam consideradas úteis e relevantes.
Questiona também, e muito bem, a opção de a professora dar o curso de forma sequencial. Não é por caso que os cursos de Português Língua de Acolhimento (PLA) estão estruturados em módulos. A estrutura modular permite gerir mais facilmente os casos de formandos que chegam mais tarde (ou com unidades temáticas já feitas).
Concordo também consigo em relação ao peso dado às várias competências, assim como à importância de partir das vivências dos formandos, tornando desta forma mais motivador o ensino e potenciando a aquisição. Também questiono, como faz, o uso do trabalho de casa, dada a dificuldade deste público em arranjar tempo para cumprir essa tarefa.
Gostei igualmente das estratégias que propõe, especialmente as de caráter lúdico. Há um artigo especificamente sobre a utilização do lúdico nas aulas de PLA que deixei no Moodle que aborda este aspeto do uso do lúdico no PLA.
Deixo-lhe, para complementar a sua excelente análise, a minha própria visão deste caso.
Enquanto professores de PLA, devemos ter em conta as idiossincrasias de uma realidade ligada à imigração que levanta questões acrescidas, dada a situação de vulnerabilidade (afetiva, social e económica) em que muitas vezes este tipo de público se encontra. O impacto pedagógico é significativo e exige respostas específicas, idealmente articuladas com outros profissionais (Grosso, 2021). Temos de lidar com um contexto educativo marcado concretamente por: uma heterogeneidade de trajetórias de aprendizagem e de perfis sociolinguísticos; baixa assiduidade dos aprendentes (ou atraso na chegada às aulas), devido a questões laborais ou dificuldades de transporte; condições de vulnerabilidade social e afetiva (Bottura e Gattolin, 2023).
É neste contexto que temos de analisar as respostas educativas de Raquel Pereira, no âmbito do curso ministrado a imigrantes no Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM) do Porto. A "heterogeneidade vincada", expressão utilizada pela própria, revela bem aquele que foi o grande desafio enfrentado. Perante esta realidade, a professora não teve dúvida em implementar uma pedagogia diferenciada.
Começo por assinalar o facto de ter sido preenchida uma ficha sociolinguística e ministrado um teste diagnóstico, que vieram corroborar a heterogeneidade da turma e que reforçaram a convicção da docente na necessidade de aplicação de uma pedagogia diferenciada. A docente parecia já ter esta decisão tomada antes de iniciar os trabalhos com a turma, pois inclui na ficha sociolinguística uma questão sobre os métodos preferidos de trabalho dos aprendentes e outra sobre interesses pessoais.
Quanto à utilização de estratégias que se inserem no âmbito da pedagogia diferenciada, a docente refere a constituição de grupos flexíveis, de acordo com o nível linguístico, da língua e dos ritmos de aprendizagem, a aprendizagem cooperativa ou a produção de materiais para aprendentes de línguas específicas.
Não há, no entanto, referência a instrumentos reguladores da aprendizagem, como o Plano Individual de Trabalho (PIT), que poderia apoiar de forma mais efetiva esta prática pedagógica. Refere a professora que, quando os aprendentes não apareciam durante um número significativo de aulas, lhes era pedido que resolvessem os exercícios mais importantes da unidade temática. Com um PIT, tanto os objetivos como as tarefas da unidade temática estariam claramente definidos, sabendo claramente o aprendente o que teria de fazer. Por outro lado, o PIT poderia contemplar também o estudo autónomo, outra parte essencial de diferenciação do ensino e das aprendizagens.
Quanto ao recurso ao trabalho de casa para efeitos de revisão e sistematização, assim como base para o registo das dificuldades individuais, não é garantido que tal estratégia resulte. Por um lado, sabemos da falta de tempo, por razões laborais, que os aprendentes têm para realizar as tarefas escolares fora da sala de aula. Por outro, trata-se de um público com uma assiduidade irregular.
Em termos de materiais didáticos, parece acertada a criação de materiais para aprendentes de línguas específicas e a adaptação de vários manuais. A criação de tópicos com base nos interesses dos aprendentes é outra das estratégias que se enquadra na pedagogia diferenciada e que merece ser destacada.
Finalmente, uma palavra para referir a preocupação da docente em promover o diálogo intercultural, de que é exemplo a partilha de produtos típicos do país de origem durante a aula.
Em suma, são vários os desafios na implementação da pedagogia diferenciada na aula de PLA. Se consultarmos o trabalho da docente, vemos quais foram essas dificuldades, que se prendem com a gestão da heterogeneidade na sala de aula (a falta de tempo para a concretização da unidade letiva, devido à divisão em grupos; o facto de certos alunos não reagirem bem a trabalhar em grupo; a sensação de dar mais atenção aos aprendentes que chegam de novo do que aos aprendentes fixos; etc.).