Discussão/ Reflexão: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA

por Natália Terroso -
Número de respostas: 1

As estratégias adotadas por Raquel Pereira procuravam dar resposta às necessidades dos alunos e, na sua globalidade, pareceram-me adequadas. O facto de inicialmente apresentar uma ficha de identificação permitiu à docente perceber que estava perante um público heterogéneo e assim, foi possível, desde logo, delinear quais as estratégias a adotar. Pareceu-me interessante a partilha de produtos característicos e a ênfase colocada nos aspetos culturais. É também um aspeto positivo o recurso a vários manuais e a materiais diversificados, seguindo as preferências dos formandos. Quanto à estratégia de marcar trabalhos de casa parece-me ser uma tarefa difícil de concretizar pelo público alvo por serem alunos que trabalham e, por isso, com pouca disponibilidade para a realização de tarefas extra-aula.

Penso que também seria importante perceber quais os instrumentos reguladores da aprendizagem e qual a configuração adotada, o que deveria ser do conhecimento dos formandos, pois só assim se efetiva um processo de avaliação transparente, que permita melhorar os resultados.

  Concluo que, apesar das observações que reportam a aspetos menos conseguidos é notória a preocupação de Raquel Pereira adotar estratégias indo ao encontro dos gostos e necessidades dos formandos.

Em resposta a 'Natália Terroso'

Re: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA

por João Paulo Pereira -
Cara Natália
Destaca na sua análise determinados aspetos da ação pedagógica da professora Raquel Pereira, que se deparou com uma turma com uma "vincada heterogeneidade" (para usar uma expressão da própria) a vários níveis, realidade que caracteriza os cursos de Português Língua de Acolhimento (PLA). Refere a importância da ficha de identificação inicial (que prenuncia o uso da pedagogia diferenciada ao perguntar qual o método de trabalho preferido). Também aponta como positiva a promoção de atividades de âmbito cultural, nomeadamente a partilha de produtos do país de origem, assim como os materiais utilizados e que procuram ir ao encontro das necessidades e das dificuldades dos alunos.
Concordo consigo quando questiona a eficácia dos trabalhos de casa, principalmente tendo em conta que muitos formandos não têm, por razões laborais, tempo para realizar este tipo de tarefa.
Podia ter aprofundado a análise em relação à utilização da pedagogia diferenciada, a forma que a docente Raquel Pereira encontrou para lidar com a heterogeneidade da turma. Por exemplo, destacando a aprendizagem colaborativa, através da constituição de grupos flexíveis. Ainda assim, aponta, e bem, a falta de instrumentos reguladores de aprendizagem, parte essencial da aplicação deste tipo de abordagem.
Faltou mobilizar alguma da bibliografia sugerida, como era pedido.
Deixo-lhe mais algumas reflexões sobre este caso.
Enquanto professores de Português Língua de Acolhimento (PLA), devemos ter em conta as idiossincrasias de uma realidade ligada à imigração que levanta questões acrescidas, dada a situação de vulnerabilidade (afetiva, social e económica) em que muitas vezes este tipo de público se encontra. O impacto pedagógico é significativo e exige respostas específicas, idealmente articuladas com outros profissionais (Grosso, 2021). Temos de lidar com um contexto educativo marcado concretamente por: uma heterogeneidade de trajetórias de aprendizagem e de perfis sociolinguísticos; baixa assiduidade dos aprendentes (ou atraso na chegada às aulas), devido a questões laborais ou dificuldades de transporte; condições de vulnerabilidade social e afetiva (Bottura e Gattolin, 2023).
É neste contexto que temos de analisar as respostas educativas de Raquel Pereira, no âmbito do curso ministrado a imigrantes no Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM) do Porto. A "heterogeneidade vincada", expressão utilizada pela própria, revela bem aquele que foi o grande desafio enfrentado. Perante esta realidade, a professora não teve dúvida em implementar uma pedagogia diferenciada.
Começo por assinalar o facto de ter sido preenchida uma ficha sociolinguística e ministrado um teste diagnóstico, que vieram corroborar a heterogeneidade da turma e que reforçaram a convicção da docente na necessidade de aplicação de uma pedagogia diferenciada. A docente parecia já ter esta decisão tomada antes de iniciar os trabalhos com a turma, pois inclui na ficha sociolinguística uma questão sobre os métodos preferidos de trabalho dos aprendentes e outra sobre interesses pessoais.
Quanto à utilização de estratégias que se inserem no âmbito da pedagogia diferenciada, a docente refere a constituição de grupos flexíveis, de acordo com o nível linguístico, da língua e dos ritmos de aprendizagem, a aprendizagem cooperativa ou a produção de materiais para aprendentes de línguas específicas.
Não há, no entanto, referência a instrumentos reguladores da aprendizagem, como o Plano Individual de Trabalho (PIT), que poderia apoiar de forma mais efetiva esta prática pedagógica. Refere a professora que, quando os aprendentes não apareciam durante um número significativo de aulas, lhes era pedido que resolvessem os exercícios mais importantes da unidade temática. Com um PIT, tanto os objetivos como as tarefas da unidade temática estariam claramente definidos, sabendo claramente o aprendente o que teria de fazer. Por outro lado, o PIT poderia contemplar também o estudo autónomo, outra parte essencial de diferenciação do ensino e das aprendizagens.
Quanto ao recurso ao trabalho de casa para efeitos de revisão e sistematização, assim como base para o registo das dificuldades individuais, não é garantido que tal estratégia resulte. Por um lado, sabemos da falta de tempo, por razões laborais, que os aprendentes têm para realizar as tarefas escolares fora da sala de aula. Por outro, trata-se de um público com uma assiduidade irregular.
Em termos de materiais didáticos, parece acertada a criação de materiais para aprendentes de línguas específicas e a adaptação de vários manuais. A criação de tópicos com base nos interesses dos aprendentes é outra das estratégias que se enquadra na pedagogia diferenciada e que merece ser destacada.
Finalmente, uma palavra para referir a preocupação da docente em promover o diálogo intercultural, de que é exemplo a partilha de produtos típicos do país de origem durante a aula.
Em suma, são vários os desafios do ensino e aprendizagem do PLA, assim como da implementação da pedagogia diferenciada neste contexto específico. Se consultarmos o trabalho da docente, vemos quais foram essas dificuldades, que se prendem com a gestão da heterogeneidade na sala de aula (a falta de tempo para a concretização da unidade letiva, devido à divisão em grupos; o facto de certos alunos não reagirem bem a trabalhar em grupo; a sensação de dar mais atenção aos aprendentes que chegam de novo do que aos aprendentes fixos; etc.).