Discussão/ Reflexão: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

por Cecília Brandão -
Número de respostas: 1

   A metodologia assente na pedagogia diferenciada e as várias estratégias implementadas pela professora Raquel Pereira são um excelente caminho para gerir a heterogeneidade dos alunos que compõem as turmas de PLA, e promovem, indubitavelmente um ambiente inclusivo e intercultural.  

   A caracterização do público-alvo, através da ficha de identificação e do teste diagnóstico, funciona como primeiro passo para definir a abordagem de diferenciação pedagógica a seguir, a escolha de estratégias a adotar, tendo, também, em conta o desenvolvimento de competências interculturais que as aulas de PLA devem proporcionar. Assim sendo, é fundamental o professor traçar o perfil dos alunos para ir ao encontro das suas necessidades e objetivos de aprendizagem, visando o seu sucesso escolar.

   Achei muito interessante a construção de grupos flexíveis de acordo com o nível linguístico, a proximidade da língua e os ritmos de aprendizagem. Penso ser uma estratégia em que os aprendentes conseguem progredir mais rapidamente e consolidar os seus conhecimentos, num ambiente de aprendizagem cooperativo, onde a partilha e entreajuda favorecem a sua evolução.

    Faz todo o sentido a produção de materiais específicos para os alunos hispanofalantes, uma vez que dominam o idioma mais próximo do português, logo partem em vantagem linguística, evidência que deve ser aproveitada e explorada.

   Para monitorizar e dar feedback das aprendizagens, penso que criar fichas de autoavaliação e fichas formativas de preparação para os testes, corrigidas em casa ou na aula pelo professor, ajudam a regular e a sistematizar o essencial das competências a serem adquiridas. Tendo em conta a minha experiência, tarefas de revisão e sistematização devem ser realizadas em sala de aula e não em casa, pois os formandos pela natureza da sua atividade profissional, poucos são aqueles que têm disponibilidade física e mental para se dedicarem a trabalhos suplementares fora do contexto escolar.   

Em resposta a 'Cecília Brandão'

Re: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

por João Paulo Pereira -
Cara Cecília
Atualmente, espera-se que o professor não fique preso a um método ou abordagem didática, mas revele ecletismo nas respostas que dá, de acordo com os contextos e os objetivos de aprendizagem (e as opções são muitas, das abordagens mais experienciais às artísticas, passando pela gamificação, por exemplo). A pedagogia diferenciada é, nesse sentido, uma resposta que faz todo o sentido tendo em conta a "vincada heterogeneidade" não só da turma da docente Raquel Pereira mas daquele que é o contexto de ensino de PLA.
Concordo, por isso, com a análise que faz das estratégias de ensino da docente em apreço, como a constituição de grupos flexíveis ou o uso de materiais para públicos específicos (como o hispanofalante). Penso que se nota, no entanto, a falta de instrumentos reguladores de aprendizagem (como o Plano Individual de Trabalho), que permitiriam pôr em prática de forma mais efetiva a pedagogia diferenciada.
Considero muito apropriadas as estratégias adicionais que propõe para a monitorização e feedback das aprendizagens.
Só faltou mobilizar alguma da bibliografia, como era pedido.
Deixo-lhe, para complementar a sua análise, a minha própria reflexão sobre este caso.
Enquanto professores de Português Língua de Acolhimento (PLA), devemos ter em conta as idiossincrasias de uma realidade ligada à imigração que levanta questões acrescidas, dada a situação de vulnerabilidade (afetiva, social e económica) em que muitas vezes este tipo de público se encontra. O impacto pedagógico é significativo e exige respostas específicas, idealmente articuladas com outros profissionais (Grosso, 2021). Temos de lidar com um contexto educativo marcado concretamente por: uma heterogeneidade de trajetórias de aprendizagem e de perfis sociolinguísticos; baixa assiduidade dos aprendentes (ou atraso na chegada às aulas), devido a questões laborais ou dificuldades de transporte; condições de vulnerabilidade social e afetiva (Bottura e Gattolin, 2023).
É neste contexto que temos de analisar as respostas educativas de Raquel Pereira, no âmbito do curso ministrado a imigrantes no Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM) do Porto. A "heterogeneidade vincada", expressão utilizada pela própria, revela bem aquele que foi o grande desafio enfrentado. Perante esta realidade, a professora não teve dúvida em implementar uma pedagogia diferenciada.
Começo por assinalar o facto de ter sido preenchida uma ficha sociolinguística e ministrado um teste diagnóstico, que vieram corroborar a heterogeneidade da turma e que reforçaram a convicção da docente na necessidade de aplicação de uma pedagogia diferenciada. A docente parecia já ter esta decisão tomada antes de iniciar os trabalhos com a turma, pois inclui na ficha sociolinguística uma questão sobre os métodos preferidos de trabalho dos aprendentes e outra sobre interesses pessoais.
Quanto à utilização de estratégias que se inserem no âmbito da pedagogia diferenciada, a docente refere a constituição de grupos flexíveis, de acordo com o nível linguístico, da língua e dos ritmos de aprendizagem, a aprendizagem cooperativa ou a produção de materiais para aprendentes de línguas específicas.
Não há, no entanto, referência a instrumentos reguladores da aprendizagem, como o Plano Individual de Trabalho (PIT), que poderia apoiar de forma mais efetiva esta prática pedagógica. Refere a professora que, quando os aprendentes não apareciam durante um número significativo de aulas, lhes era pedido que resolvessem os exercícios mais importantes da unidade temática. Com um PIT, tanto os objetivos como as tarefas da unidade temática estariam claramente definidos, sabendo claramente o aprendente o que teria de fazer. Por outro lado, o PIT poderia contemplar também o estudo autónomo, outra parte essencial de diferenciação do ensino e das aprendizagens.
Quanto ao recurso ao trabalho de casa para efeitos de revisão e sistematização, assim como base para o registo das dificuldades individuais, não é garantido que tal estratégia resulte. Por um lado, sabemos da falta de tempo, por razões laborais, que os aprendentes têm para realizar as tarefas escolares fora da sala de aula. Por outro, trata-se de um público com uma assiduidade irregular.
Em termos de materiais didáticos, parece acertada a criação de materiais para aprendentes de línguas específicas e a adaptação de vários manuais. A criação de tópicos com base nos interesses dos aprendentes é outra das estratégias que se enquadra na pedagogia diferenciada e que merece ser destacada.
Finalmente, uma palavra para referir a preocupação da docente em promover o diálogo intercultural, de que é exemplo a partilha de produtos típicos do país de origem durante a aula.
Em suma, são vários os desafios do ensino e aprendizagem do PLA, assim como da implementação da pedagogia diferenciada neste contexto específico. Se consultarmos o trabalho da docente, vemos quais foram essas dificuldades, que se prendem com a gestão da heterogeneidade na sala de aula (a falta de tempo para a concretização da unidade letiva, devido à divisão em grupos; o facto de certos alunos não reagirem bem a trabalhar em grupo; a sensação de dar mais atenção aos aprendentes que chegam de novo do que aos aprendentes fixos; etc.).