O documento Inclusão de alunos migrantes em meio educativo, publicado pela Direção-Geral de Educação em janeiro de 2024, na minha ótica, constitui um protótipo bem definido, sistematizado, clarificador, esclarecedor, diria quase perfecionista de um conjunto de princípios e estratégias que se devem e podem adotar e adaptar em meio educativo. O modelo de inclusão proposto acarreta, todavia, algumas questões e situações que podem dificultar e/ou até mesmo impossibilitar a concretização e realização do mesmo, acabando por se evidenciar quase como um desejo, uma ambição de se pretender estabelecer a inclusão de alunos migrantes em meio educativo, porém um processo que pode ser complexo e moroso se tivermos em conta que o sistema educativo, numa visão global, ainda vive sob a alçada de bastante instabilidade, estagnação, insegurança, diferenciação nos modos de atuação, gestão, organização e utilização dos meios existentes ou da escassez dos mesmos, assim como sob alguma incoerência e desajustamentos na gestão e colocação dos vários recursos humanos aí existentes e/ou não existentes.
Penso que a Escola que queremos é de facto a que se encontra esboçada no documento, porém não é a Escola que temos.
A Escola ainda tem um longo caminho a percorrer para dar resposta às necessidades da efetiva e célere inclusão dos migrantes em meio educativo.
Diria que a Escola tem ainda de se adaptar às mudanças que derivam do crescente aumento de migrantes a ingressar em meio educativo português, tendo para tal de se reinventar, aceitar, acolher e educar para a diversidade, o que nem sempre acontece por vários motivos. Primeiro, tal como o documento refere fica ao critério de cada escola a sua apropriação ou a definição de outras estratégias que considerem mais adequadas ao seu contexto, facto que gera complexidade e diferenciação nas tomadas de decisão das Direções Escolares, na gestão e organização, sendo que sobressaem Escolas que atuam pela positiva, que conseguem obter eficácia nas estratégias adotadas com meios para tal resultado, outras pela negativa porque não implementam e/ou não conseguem fazê-lo por falta de meios e/ou de aceitação superior de novas realidades, falta de conhecimento, formação, vontade e/ou iniciativa e outras Escolas que não têm infraestruturas e pessoal docente e não docente para a concretização da inclusão. Outro ponto problemático referido é que cabe à Escola definir o processo de acolhimento de alunos migrantes que contemple as etapas, os intervenientes, os meios a mobilizar e avaliação e monitorização, sendo que os intervenientes, a coordenação/equipa responsável tem de ter perfil adequado, formação, empatia e abertura à diversidade cultural. Neste ponto é questionável como se avalia este perfil, que critérios de seleção se definem para este perfil e quem os estabelece? Para haver Gabinete de atendimento aos migrantes e disponibilização de documentos em várias línguas são necessários outros intervenientes e meios.
Será que todos os intervenientes da Comunidade Escolar reconhecem e respeitam as diferenças, designadamente os valores familiares, as práticas religiosas e as tradições dos migrantes?
Como e quem define o perfil adequado, em particular para os docentes e não docentes que têm uma intervenção mais sistemática no acompanhamento dos alunos migrantes?
Promover a diversidade das ofertas da escola é desejável, mas ao nível da alimentação, das atividades de complemento curricular e da disponibilização de publicações, em várias línguas, na biblioteca, implicará a existência, reajustamentos de espaços, de diversos meios e de contratação de mais pessoal. A Comunidade Escolar estará aberta à diversidade no sentido de criar laços com as famílias e promover o sentido de pertença através de atividades informais que envolvam a participação de pais das culturas em presença?
No contexto da aprendizagem e avaliação, as EMAEI têm de estar dotadas de meios e de pessoal suficiente e formado na definição e implementação de medidas que promovam a inclusão destes alunos. Na criação de condições para que, em todas as disciplinas, haja a apropriação da língua portuguesa, designadamente ao nível científico e técnico, estarão os docentes de todas as disciplinas disponíveis para se corresponsabilizarem no processo de ensino e inclusão do aluno migrante?
Relativamente ao papel da Comunidade, a inclusão dependerá de iniciativas, prioridades e de políticas das entidades locais, Autarquias, Unidades de Saúde, da existência de Associações de migrantes (que existem em maioria nos grandes centros urbanos e não em zonas de baixa densidade), de IPSS, de Instituições culturais, clubes desportivos, entre outras. Não havendo respostas locais o recurso será também bastante moroso e difícil a nível regional ou nacional através da AIMA, I.P. - Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I.P., quando estes próprios organismos não conseguem também dar resposta a muitas necessidades dos migrantes.
Existem de facto várias condicionantes que determinam a eficácia na implementação do processo de inclusão e ensino adaptado aos alunos migrantes que influenciam a preparação, a agilização, a comunicação para acolher e as formas de aprendizagem e de avaliação para integrar. Para tal, as políticas financeiras, económicas, sociais, educacionais e culturais de acolhimento têm de assumir um papel mais preponderante e consistente para que o meio educativo português possa, na verdade, fomentar a desejada inclusão dos alunos migrantes com ubiquidade, equidade e igualdade.