Discussão/ Reflexão: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

by Dulce Maria Pereira Marques -
Number of replies: 2

Em primeiro lugar, a Prof. Teresa Pereira apresenta um leque de sugestões estratégicas e procedimentos bastante coeso e diversificado, sendo que o teste diagnóstico como ponto de partida me parece muito eficaz para determinar o tipo de abordagem que irá ter com a turma, por mais que o nível de certificação esteja previamente definido.

De facto, a fase de diagnóstico é muito importante para escolher o tipo de materiais a criar e o pequeno grupo de aprendentes a quem se destinam, apostando na diversidade. Note-se aqui a preocupação da professora em distinguir os aprendentes hispanofalantes dos restantes, uma vez que a base linguística é naturalmente mais próxima do português do que o que acontece com aqueles que têm, inclusive, uma escrita diferente, como é o caso dos russos, com um alfabeto diferente.

Considero também muito positiva a estratégia de interação com base na partilha de produtos de origem de cada país, com a intenção de promover a coesão do grupo, assim como a utilização de materiais distintos para dar resposta à heterogeneidade da  turma.  

Relativamente ao trabalho de casa, confesso a minha apreensão, até porque o seu público-alvo deverá ser maioritariamente trabalhador e esse tipo de atividade extra nem sempre é bem recebido. Pelo menos tal acontece nas minhas turmas de PLA, em que os formandos chegam já com atraso às aulas devido ao horário de trabalho e são pouco flexíveis ao trabalho fora da aula.  

Em contrapartida, a criação de tópicos de discussão parece-me muito positiva e, normalmente, acaba por ser um momento de catarse para os formandos que parecem compreender melhor determinados aspetos quando estes são enunciados pelos seus pares, à semelhança das tutorias no caso dos alunos mais jovens. Neste caso, as dúvidas de uns são os esclarecimentos de outros.

Por fim, relativamente à avaliação, em vez de apenas um exame final, que muitas das vezes se torna num obstáculo emocional, optaria por vários testes intermédios para que os formandos criassem hábitos de avaliação e não ficassem nervosos perante o suposto peso de um exame.

Para os formandos que têm mais dificuldades em acompanhar o rápido ritmo que o referencial impõe, poderia sugerir a criação dos já velhinhos “objetivos mínimos” com base nas áreas vocabulares de cada unidade a trabalhar, por exemplo, com base nos jogos de vocabulário, Wordwall, ou até fichas com exercícios de aquisição de vocabulário com base no livro da LIDEL, Vamos Lá Começar, Níveis Elementar e Intermédio. Propunha ainda a utilização da App Português para Principiantes, com exercícios básicos de áudio e escrita, para tentar colmatar as dificuldades existentes na preparação para os vários momentos de avaliação.

Por norma, as pequenas apresentações orais sobre assuntos de cariz individual, como a roupa que traz vestida, o país onde vive, a descrição da sua casa ou da sua casa de sonho, acabam por desbloquear um pouco o aprendente e resolvem as nossas dúvidas em termos de avaliação.

In reply to Dulce Maria Pereira Marques

Re: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

by Dulce Maria Pereira Marques -
Por lapso, indiquei erradamente o nome da professora. Onde escrevi "Teresa Pereira", queria dizer "Raquel Pereira".
In reply to Dulce Maria Pereira Marques

Re: Gestão da heterogeneidade nas aulas de PLA: Caso prático

by João Paulo Pereira -
Cara Dulce
Destaca na sua análise determinados aspetos da ação pedagógica da professora Raquel Pereira, que se deparou com uma turma com uma "vincada heterogeneidade" (para usar uma expressão da própria) a vários níveis, realidade que caracteriza os cursos de Português Língua de Acolhimento (PLA). Refere a importância do diagnóstico inicial (que prenuncia o uso da pedagogia diferenciada ao perguntar qual o método de trabalho preferido). Também aponta como positiva a estratégia relacionada com a criação de tópicos de discussão, assim como a promoção de atividades de âmbito cultural, como a partilha de produtos do país de origem.
Propõe também, e bem, estratégias com vista a mitigar a heterogeneidade da turma. Destaco aquela que tem a ver com a utilização do vocabulário como ponto de partida para as aprendizagens, bastante pertinente sobretudo nos níveis iniciais.
Também concordo quando questiona a eficácia dos trabalhos de casa, principalmente tendo em conta que muitos formandos não têm, por razões laborais, tempo para realizar este tipo de tarefa.
Podia ter referido a utilização da pedagogia diferenciada, a forma que a docente Raquel Pereira encontrou para lidar com a heterogeneidade da turma. Por exemplo, destacando a aprendizagem colaborativa, através da constituição de grupos flexíveis. Ainda que considere que a docente em apreço podia ter utilizado instrumentos reguladores de aprendizagem, como o Plano Individual de Trabalho.
E faltou mobilizar alguma da bibliografia sugerida, como era pedido.
No entanto, fez uma análise muito cuidada e, repito, fundamentada. Para a complementar, deixo-lhe a minha própria reflexão.
Enquanto professores de PLA, devemos ter em conta as idiossincrasias de uma realidade ligada à imigração que levanta questões acrescidas, dada a situação de vulnerabilidade (afetiva, social e económica) em que muitas vezes este tipo de público se encontra. O impacto pedagógico é significativo e exige respostas específicas, idealmente articuladas com outros profissionais (Grosso, 2021). Temos de lidar com um contexto educativo marcado concretamente por: uma heterogeneidade de trajetórias de aprendizagem e de perfis sociolinguísticos; baixa assiduidade dos aprendentes (ou atraso na chegada às aulas), devido a questões laborais ou dificuldades de transporte; condições de vulnerabilidade social e afetiva (Bottura e Gattolin, 2023).
É neste contexto que temos de analisar as respostas educativas de Raquel Pereira, no âmbito do curso ministrado a imigrantes no Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM) do Porto. A "heterogeneidade vincada", expressão utilizada pela própria, revela bem aquele que foi o grande desafio enfrentado. Perante esta realidade, a professora não teve dúvida em implementar uma pedagogia diferenciada.
Começo por assinalar o facto de ter sido preenchida uma ficha sociolinguística e ministrado um teste diagnóstico, que vieram corroborar a heterogeneidade da turma e que reforçaram a convicção da docente na necessidade de aplicação de uma pedagogia diferenciada. A docente parecia já ter esta decisão tomada antes de iniciar os trabalhos com a turma, pois inclui na ficha sociolinguística uma questão sobre os métodos preferidos de trabalho dos aprendentes e outra sobre interesses pessoais.
Quanto à utilização de estratégias que se inserem no âmbito da pedagogia diferenciada, a docente refere a constituição de grupos flexíveis, de acordo com o nível linguístico, da língua e dos ritmos de aprendizagem, a aprendizagem cooperativa ou a produção de materiais para aprendentes de línguas específicas.
Não há, no entanto, referência a instrumentos reguladores da aprendizagem, como o Plano Individual de Trabalho (PIT), que poderia apoiar de forma mais efetiva esta prática pedagógica. Refere a professora que, quando os aprendentes não apareciam durante um número significativo de aulas, lhes era pedido que resolvessem os exercícios mais importantes da unidade temática. Com um PIT, tanto os objetivos como as tarefas da unidade temática estariam claramente definidos, sabendo claramente o aprendente o que teria de fazer. Por outro lado, o PIT poderia contemplar também o estudo autónomo, outra parte essencial de diferenciação do ensino e das aprendizagens.
Quanto ao recurso ao trabalho de casa para efeitos de revisão e sistematização, assim como base para o registo das dificuldades individuais, não é garantido que tal estratégia resulte. Por um lado, sabemos da falta de tempo, por razões laborais, que os aprendentes têm para realizar as tarefas escolares fora da sala de aula. Por outro, trata-se de um público com uma assiduidade irregular.
Em termos de materiais didáticos, parece acertada a criação de materiais para aprendentes de línguas específicas e a adaptação de vários manuais. A criação de tópicos com base nos interesses dos aprendentes é outra das estratégias que se enquadra na pedagogia diferenciada e que merece ser destacada.
Finalmente, uma palavra para referir a preocupação da docente em promover o diálogo intercultural, de que é exemplo a partilha de produtos típicos do país de origem durante a aula.
Em suma, são vários os desafios na implementação da pedagogia diferenciada na aula de PLA. Se consultarmos o trabalho da docente, vemos quais foram essas dificuldades, que se prendem com a gestão da heterogeneidade na sala de aula (a falta de tempo para a concretização da unidade letiva, devido à divisão em grupos; o facto de certos alunos não reagirem bem a trabalhar em grupo; a sensação de dar mais atenção aos aprendentes que chegam de novo do que aos aprendentes fixos; etc.).